Falta tecnologia nos canteiros de obras, mostra pesquisa da ABDI
A construção civil faz pouco uso das ferramentas tecnológicas mais modernas, ficando atrás de outros segmentos da economia, apontou pesquisa da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI). De acordo com a entidade, essa realidade diminui a produtividade do setor e aumenta o desperdício, o que gera impacto no preço ao consumidor final. Segundo a pesquisa, 95% dos entrevistados querem aprender sobre inovação, mas apenas 25,5% conhecem aplicações concretas de tecnologias 4.0, como impressão 3D, gestão digital de documentos, inteligência artificial e internet das coisas.
A pesquisa está alinhada à sondagem feita pela ABDI sobre a digitalização de empresas brasileiras. O levantamento apontou que 23% do setor da construção civil realiza investimento em transformação digital, número que sobe para 52% em serviços; para 66%, no comércio; e 68%, na indústria.
A gerente de projetos especiais da ABDI, Cynthia Mattos, diz que esse gargalo traz consequências para a competitividade do setor: “Há muita possibilidade de melhorar em produtividade e competitividade, fatores que impactam no preço ao consumidor final.”
Mattos diz que, ao se melhorar a produtividade, evita-se perdas e descarte de materiais de construção, trazendo ganhos de sustentabilidade aos projetos: “A ABDI busca promover e sensibilizar o setor para inovação digital, realizando capacitação para o uso das novas ferramentas tecnológicas.”
De acordo com a Pesquisa Nacional Sobre a Digitalização das Engenharias no Brasil, feita em parceria com o BIM Forum Brasil e o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea/Crea), a predominância no setor é de uso de tecnologias 2.0 (62,4%), de pouca digitalização.
Embora o setor não trabalhe mais na tradicional prancheta, Larissa Santos, assessora técnica de projetos especiais da ABDI, explica que as ferramentas tecnológicas adotadas, em sua maioria, são reproduções digitais do espaço físico de uma construção.
“As linhas da planta de um projeto são digitalizadas, o que é feito com tecnologia 2D, na maioria das vezes. As novas ferramentas possibilitam digitalização 3D. Mas não é só isso: as tecnologias 4.0 carregam informações dentro dos elementos representados, o que permite planejar a construção e fazer análises, como quantificar o gasto da obra”, diz.
De acordo com Laura Lacaze, diretora da TresT Consultoria, responsável pela coordenação técnica do estudo, a tecnologia 4.0 é uma “revolução dentro da revolução”, focada na gestão e planejamento dos projetos de forma integrada. “As tecnologias 3.0 são compartimentadas. Há um software para gestão, outro para modelagem, mais um para comunicação com clientes ou funcionários. Agora, é possível integrar os sistemas”, diz. Outra inovação é usar a inteligência artificial e algoritmos, que poderão vasculhar, analisar e trazer informações sobre os projetos.
O conceito por trás desse novo sistema de gestão é conhecido como Building Information Modelling (BIM). “O modelo não é apenas a representação gráfica de um espaço, é uma grande bacia de dados, para que um projeto seja construído de forma mais eficiente, com foco na gestão”, diz Lacaze.
Com o propósito de difundir, incentivar e criar políticas, tanto no setor privado como público, para uso desta metodologia, o governo criou, em 2018, a Estratégia BIM BR, que estabelece prazos para a adoção do modelo e metas. De acordo com o decreto do governo federal, as obras e serviços de engenharia contratados pela
Administração Pública Federal devem ser executados em BIM, seguindo três fases. A partir de 2021, os projetos das construtoras devem ser feitos pelo modelo; a partir de 2024, projetos e obras têm que utilizar o BIM; e, a partir de 2028, todas as fases da edificação (projetos, obras e pós-obras) passam a ser incluídas.
Segundo a ABDI, 9,2% das empresas de construção civil implantaram o BIM na rotina de trabalho, o que representa 5% do PIB do setor. Com a estratégia governamental, espera-se que esse número chegue a 50%. A iniciativa estabelece ainda metas até 2028: aumento de 10% de produtividade, redução de custos de 9,7%; e aumento do PIB da construção civil em 28,9%.
Projetos-piloto da Polícia Rodoviária Federal (PRF), metrô de São Paulo, Forças Armadas e Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit) já foram feitos com uso do BIM. Além disso, o Ministério da Economia lançou, em abril, o Construa Brasil, que busca encontrar gargalos e capacitar o setor, identificando soluções tecnológicas de planejamento e gestão, assim como desburocratização do segmento.
Lacaze diz que a expansão da conectividade, com o 5G, pode auxiliar o setor: “Uma empresa de construção civil se desloca geograficamente, não faz uma obra duas vezes no mesmo local. Boa parte das soluções tecnológicas para o setor depende do volume, fluxo e velocidade dos dados. Não apenas na sede da empresa, mas nos locais de obra, que podem estar muito afastados e precisam estar conectados. A expansão da rede, com custos razoáveis e sem interrupção, é chave para a adoção de tecnologias de ponta”.